quarta-feira, 30 de março de 2022

IHGRN 120 anos - discurso de Maria Elza Bezerra Cirne

    Discurso proferido pela diretora financeira do IHGRN, Maria Elza Bezerra Cirne, em 29 de março de 2022, na solenidade de comemoração dos 120 anos do IHGRN e posse da nova Diretoria (triênio 2022-2025).

Foto: Sylvia Serejo

    “O homem é um átomo insignificante no conjunto dos mundos infinitos; a vida - um mero acidente sem importância, em si mesma considerada. Só a ideia, que germina misteriosamente no cérebro privilegiado do gênio, e cresce, enflora e frutifica, afinal, como força expansiva e criadora - perdura sempre. Só ela faz, do átomo insignificante – um ser imortal, e, da vida do homem, simples no nada - uma coisa verdadeiramente preciosa, de valor inestimável, constante e perene no tempo e no espaço; sem embargo da fereza atroz e da brutalidade da morte, que, então, é realmente vencida na sua efêmera vitória”.
    Trecho do discurso do Desembargador Francisco de Salles Meira e Sá, em homenagem a Augusto Severo de Albuquerque Maranhão, por ocasião de sua morte, em 12 de maio de 1902, logo após o dirigível Pax levantar voo no céu de Paris e explodir violentamente, vitimando o norte-rio-grandense ilustre e seu mecânico, George Sachet.
    Francisco de Salles Meira e Sá, paraibano de nascimento, órfão de mãe, veio residir no Rio Grande do Norte em razão do seu pai, Dr. Olyntho José Meira, exercer o cargo de presidente da Província. Abolicionista e republicano, Meira e Sá formou-se bacharel em Direito pela Faculdade de Recife, foi Promotor, Juiz de Direito, Chefe de Polícia, Desembargador e Presidente do Tribunal de Justiça, Juiz Federal, Deputado Estadual, Vice-Governador e Senador pelo Rio Grande do Norte.
    Além de sua carreira jurídica e política, Meira e Sá teve profunda preocupação com a educação. Foi fundador e diretor do Colégio São Francisco de Sales, em Ceará Mirim, presidiu o Popular Instituto Literário de Ceará-Mirim, o Instituto de Proteção à Infância de Natal e a Liga de Ensino, criadora e mantenedora da Escola Doméstica de Natal. Por fim (ufa!), foi Membro fundador e orador deste Instituto.
    Gostaria muito de tê-lo conhecido, ele foi meu trisavô materno. Com muito orgulho, hoje ocupo a sua cadeira nesta Instituição e tenho a honra de assumir o encargo de oradora desta solenidade, para saudar os novos sócios e parabenizar a diretoria ora empossada.
    O Desembargador Meira e Sá e mais 25 cidadãos - todos homens - reuniram-se em Natal, no dia 29 de março de 1902, para fundar o Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte. Uma ideia que germinou, cresceu, enflorou e frutificou como a mais antiga instituição cultural do nosso estado.
    Ao tentar responder o que é o tempo, Santo Agostinho declarou que se nada sobreviesse, não haveria tempo futuro, e se agora nada houvesse, não existiria o tempo presente, pois é no presente que narramos os acontecimentos relatados na memória e impulsionamos o futuro.
    29 de março de 2022. Estamos aqui reunidos para celebrar os 120 anos da Casa da Memória. Graças a ela, podemos resgatar os importantes personagens e fatos que construíram a nossa existência, alçando-os à imortalidade.
    Através da figura do meu trisavô, quero lembrar todos aqueles que, em algum momento, contribuíram para a construção de nossa história e geografia.
    O Rio Grande do Norte, este pequeno estado do imenso Brasil, é um gigante em pioneirismo. Em 1885, antes mesmo de a Princesa Isabel sancionar a Lei Áurea, o Barão de Serra Branca libertou os seus escravos e a Baronesa, D. Belisária, os serviu pessoalmente no banquete para comemorar o feito; Augusto Severo foi precursor da aviação; em 1927, o voto feminino foi aprovado em nosso estado - uma atitude de vanguarda no Brasil e na América do Sul; em 1928, a praia de Touros recebeu os aviadores Carlo Del Prete e Arturo Ferrain, na primeira travessia aérea, sem escala, entre a Europa e o Brasil.
    Ao longo do tempo, várias mulheres se destacaram: Clara Camarão, Nísia Floresta, Belisária Lins Wanderley (Baronesa de Serra Branca), Isabel Gondim (primeira mulher a fazer parte do IHGRN), Amélia Duarte Machado, Palmyra Wanderley, Alzira Soriano, Maria do Céu Fernandes, Zila Mamede e tantas outras, conhecidas e anônimas, que enfrentaram com coragem a quebra de paradigmas.
    E hoje fazemos história! Além de parabenizar os novos sócios e a diretoria, celebramos Joventina Simões Oliveira como a primeira mulher a assumir a presidência do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte.
    Somente 120 anos após a sua fundação, uma mulher assume a presidência. Em pleno século XXI, não temos mais espaço para desigualdades entre homens e mulheres.
    Hoje, mais do que nunca, confreiras e confrades precisam trabalhar em união, germinar ideias, construir parcerias com a sociedade, ser protagonistas da história e não meros narradores de episódios passados.
    No presente, homens e mulheres devem cumprir, em igualdade de condições, o papel de impulsionar o futuro e transformar o átomo insignificante em vida verdadeiramente preciosa, de valor inestimável, constante e perene no tempo e no espaço.