IHGRN: A paixão de Oswaldo Lamartine pelo sertão e sua obra são um legado indelével na literatura local e nacional sobre o tema. De onde surgiu a ideia da criação dessa comissão?
Gustavo Sobral: A documentação de Oswaldo Lamartine, infelizmente, anda dispersa e em arquivos particulares inacessíveis. Recentemente, publiquei um trabalho sobre a obra de Oswaldo Lamartine, um dicionário, e chegou até mim, pela generosidade de Murilo Paiva, uma pasta de Lamartine com documentos. O certo e o correto é que esta documentação, como é em todo mundo e até em outros estados brasileiros, fique sob a guarda de uma instituição e acessível. Esta é a razão desta comissão pioneira e deste gesto inédito. Não guardar para mim ou fazer um uso pessoal de um documento que é parte da cultura do Rio Grande do Norte e do Brasil.
IHGRN: Como estudioso da obra de Lamartine, que importância você considera ter a criação de uma comissão de estudos sobre documentos outrora pertencentes a ele?
Gustavo Sobral: O Instituto é a instituição cultural mais antiga em atividade no Rio Grande do Norte. E é a mais plural, pois não se limita à história e à geografia e tem sócios das mais diversas formações. O que acusam ser a sua fraqueza é, portanto, a sua fortaleza. Foi sempre multidisciplinar e transdisciplinar. Enquanto as universidades ainda praticam a ciência como no século XX, o instituto já vai além, envolve outros saberes, que não só o científico, e faz e sempre fez como no ensaio, o exercício livre da pesquisa uma de suas formas de expressão. Ter esta documentação em uma instituição que tem esta proposta de ação no seu bojo é ter estes documentos no lugar certo.
IHGRN: Que documentos do escritor serão seu objeto de estudo?
Gustavo Sobral: A sua pergunta nos permite pela primeira vez tornar público o que até então era de conhecimento apenas da comissão: os valiosos documentos que estão na pasta. Direi em primeira mão que fiz uma análise e escrevi uma apreciação sobre rascunhos até então inéditos de Oswaldo Lamartine para a escritora Rachel de Queiroz. Lamartine foi consultor da romancista quando ela escrevia o Memorial de Maria Moura. É uma beleza. Anotações do próprio punho e desenhos dele explicando um tanto de coisa do sertão. Uma relíquia!
IHGRN: Fale um pouco sobre as anotações de Lamartine para Rachel de Queiroz. Em que contexto foram feitas?
Gustavo Sobral: A caligrafia perfeita, tudo numerado, anotado, descrito, Oswaldo Lamartine era muito organizado e tece toda uma série de apontamentos sobre as coisas mais diversas do sertão antigo para Rachel de Queiroz situar o romance. No Dicionário Oswaldo Lamartine que acabei de publicar e que está também disponível para aquisição na sede do Instituto, reproduzo uma explicação de Rachel de Queiroz sobre como tudo começou.
IHGRN: Como a descoberta e análise desses documentos podem ajudar pesquisadores e acadêmicos em suas pesquisas?
Gustavo Sobral: Aprendi no Instituto e está lá desde o seu primeiro estatuto que é tarefa da instituição arquivar, manter, organizar e disponibilizar documentos históricos e culturais do Rio Grande do Norte. Ao publicar estes trabalhos de Oswaldo Lamartine e sobre ele, acredito que estamos apresentando-os aos interessados e inspirando aqueles que guardam documentos alheios importantes, sobretudo intelectuais, escritores e pesquisadores, que cheguem a instituições como Instituto para que tenham o mesmo propósito e finalidade.